aprendendo

Uma carta ao luto e a dor

(Abrindo meu coração sobre esses sentimento pela perda da minha sogra Nádia)

Caro luto e dor, há um ano atrás recebi sua visita. Era uma manhã de sábado, com um céu lindo, mas que ficou um pouco ofuscado pelos olhos lacrimejantes. Foi um dia que você ficou do meu lado, enquanto eu dava e recebia consolo de pessoas amadas. Infelizmente, sua chegada não foi inesperada. Por mais que doesse e eu quisesse negar, sabia que você logo chegaria.

Os dias antes da sua chegada já estavam bem difíceis, pois apesar de ainda termos ela ali, já não podíamos mais conversar, rir, comer e dividir a vida.

Nós já nos encontramos em outras épocas, mas dessa vez eu sabia que seria diferente, só não imaginei que seria tanto assim.

Quando você chegou, eu não senti que deveria te aceitar, que você poderia ficar um ou dois dias apenas e que não era necessária. Que você era errada, era algo que me afastaria de Deus. Eu tinha uma vida com muitos compromissos para continuar. Eu tinha um bebê para alimentar e cuidar. Eu tinha um marido que tinha perdido uma das pessoas mais importantes da vida dele, tinha toda a família já na sua companhia. E olha só que loucura, eu pensei que eu não poderia te ter por perto, mas do que os outros tinham. Sim, eu também estava triste, com um rombo enorme em meu coração, mas me parecia errado. Isso me fez te afastar, tentar não sentir, deixar para depois, fazer a ficha não cair, esconder e reprimir meus sentimentos. Que tolice a minha.

Não tinha como faze-la ir embora sem sentir sua presença de forma intensa, então, pode ter demorado um pouco, mas os dias chegaram. Quando eu menos esperava, lá estávamos nós caminhando juntos. Uma lagrima depois de um pensamento de lamento. Muitas lágrimas antes de dormir. Lágrimas ao pensar, ao lembrar, ao falar. Eu sei, demorei para viver essa fase tão necessária depois da partida de alguém, mas finalmente, me deixei sentir. Deixei que a dor da perda, a dor das lembranças e a dor da falta tomassem conta de mim. Só que fiz isso no silêncio. E ainda faço. Falar para alguém que também pode sentir isso me traz um mal sentimento, então fiz isso na presença da única pessoa que entende todas as minhas dores. O único que poderia me trazer a esperança de lembrar que tudo coopera para o meu bem e que ele nunca me deixou sozinha com você.

Hoje, mesmo depois desses meses, ainda temos uns momentos juntos. Eu sei que você fica um tempo diferente com cada pessoa, e que está tudo bem. Sei que você não é para sempre e não deve ser. Não devo me acostumar com sua companhia, porque você não deve fazer morada, só visitas.

Infelizmente, por causa do pecado, você aparece. A morte é o salário que ninguém fica sem receber aqui na terra, mas a vida continua para aqueles que receberam o dom e poder daquele que venceu a morte. Eu sei que ela está no lugar que deveria e na presença do seu amado salvador. Que ela não tem mais o sofrimento e as dificuldade que a acompanhavam aqui. E um dia você não mais existirá, assim como a morte, dor, tristeza e saudade.

Queria agradecer por você existir, porque Deus te permite nos visitar. Ele não me condena por te ter por perto, mas ele me ajuda a te mandar embora. Ele me mostra que o único que deve permanecer e fazer morada, é Ele. Que Ele é sempre bom e que é soberano, fazendo todas as coisas belas em seu tempo.

Não é fácil sofrer, não é fácil lembrar. Não é fácil sentir a síndrome de impostor, em pensar que meu sofrimento tem menos valor e que não deve ser demostrado porque, apesar de ser minha família, a pessoa amada não era do meu sangue. Mas eu sei que essas coisas são mentira e que cada um vai sofrer do seu modo, no seu tempo.

A ferida ainda está aberta, mas sei que um dia será apenas uma cicatriz, que não trará mais dor, mas boas lembranças.

Você ainda está aqui, mas espero que sua ida seja em breve. Enquanto isso não acontece, vamos nos falando.

“Quando a dor acaba, a lembrança disso muitas vezes se torna um prazer. Mas ainda assim, a primeira dor é sempre a mais profunda, embora não possamos nos lembrar disso depois de um tempo.” Jane Austen – Persuasão

De sua amiga Virginia.

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